domingo, 28 de junho de 2015

Maria Felipa, a Heroína Negra da Independência, símbolo de resistência.

Marisqueira, como muitas outras mulheres da Ilha de Itaparica, Maria Felipa viveu na Ponta das Baleias e foi “Heroína Negra da Independência”, mas quem é essa figura sobre a qual pouco ou quase nada se conhecia?


Sua história ficou preservada na memória da população insular. Segundo os relatos, Maria Felipa viveu na Ponta das Baleias, no Convento, casarão que tinha esse nome “porque abrigava [...] os que só tinham de seu o sol e a lua [1]
É descrita como uma negra alta e forte, que vestia saias rodadas, bata, torso e chinelas.

Liderando um grupo de mulheres e homens de diferentes classes e etnias, fortificou as praias com a construção de trincheiras, organizou o envio de mantimentos para o Recôncavo e as chamadas “vedetas” que eram vigias nas praias, feitas dia e noite, a fim de prevenir o desembarque de tropas inimigas além de participar ativamente de vários conflitos.

"Cansanção, assim como a urtiga, causa a sensação de queimadura ao toque com a pele."

Durante as batalhas, seu grupo ajudou a incendiar inúmeras embarcações: a Canhoneira Dez de Fevereiro, em 1º de outubro de 1822, na praia de Manguinhos; a Barca Constituição, em 12 de outubro de 1822, na Praia do Convento; em 7 de janeiro de 1823, liderou aproximadamente 40 mulheres na defesa das praias de Itaparica. Armadas com peixeiras e galhos de cansanção surravam os portugueses para depois atear fogo aos barcos usando tochas feitas de palha de coco e chumbo.

Citada claramente por alguns autores como Xavier Marques no romance histórico O Sargento Pedro e pelo historiador Ubaldo Osório em A Ilha de Itaparica
A história de Maria Felipa pode bem ter sido inspiração para a Maria da Fé de Viva o Povo Brasileiro, obra de João Ubaldo Ribeiro.
Diferente das outras heroínas do panteão do 2 de Julho, Maria Felipa transgrediu os padrões impostos pela sociedade por ser mulher e liderar um grupo armado e, sendo negra e pobre, reivindicar direitos mesmo após o fim da guerra.

Na primeira cerimônia de hasteamento da bandeira nacional, após a derrota definitiva dos portugueses, na Fortaleza de São Lourenço em Ponta das Baleias, Felipa e seu grupo do qual são conhecidas Joana Soaleira, Brígida do Vale e Marcolina, invadem a Armação de Pesca de Araújo Mendes, português abastado, e surram o vigia Guimarães das Uvas, evidenciando que as lutas da população itaparicana não haviam terminado. Esse evento demonstra também a hostilidade que havia entre a população brasileira, principalmente negra e mulata e os lusitanos que resultavam em conflitos denominados mata-marotos.

Mulher, pobre, negra, marisqueira, essas são características não só de Maria Felipa, mas de um grupo que teve participação significativa no processo de libertação da Bahia, mas que permanece, sob vários aspectos, ignorado.

Ela é um símbolo de resistência, de uma população que mesmo notificada para deixar a ilha pelo governo de Cachoeira, preferiu permanecer e lutar pela sua liberdade. Numa passagem do romance O Sargento Pedro, os homens estão se preparando para um ataque português e Maria Felipa segura uma tocha para que os pescadores cavem uma trincheira, um deles diz “Estou cavando a minha cova…” e é imediatamente retrucado por ela “Cava, mas não p’ra ti. . .”[2]
Mesmo sem comprovação documental sobre Maria Felipa, sua existência já está registrada pela população itaparicana, através da memória que lhe confere diferentes significados, para estas pessoas ela é um personagem real inserido em suas histórias de vida e realidade social.

BIBLIOGRAFIA
AMADO, Janaína. O Grande mentiroso: tradição, veracidade e informação em história oral. História. São Paulo, n. 14, p. 125-136, 1995.
FARIAS, Eny Kleyde Vasconcelos de. Maria Felipa de Oliveira: heroína da independência da Bahia. Salvador: Quarteto, 2010.
MARQUES, Xavier. Sargento Pedro: tradições da independência. 2. ed. Salvador: Catilina, 1921.
REIS, João José; SILVA, Eduardo. Negociação e Conflito: a resistência negra no Brasil escravista. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
RIBEIRO, João Ubaldo. Viva o Povo Brasileiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.
TAVARES, Luis Henrique Dias. História da Bahia. 10. ed. Salvador; São Paulo: UNESP; Edufba, 2001.
______. Independência do Brasil na Bahia. Salvador: EDUFBA, 2005


Conheça o estudo e alguns resultados de projetos de Pesquisa Participativa de Base Comunitária(PPBC) envolvendo duas comunidades tendo como foco saúde, ambiente e trabalho de pescadoras artesanais/marisqueiras. 

SAÚDE, AMBIENTE E TRABALHO EM COMUNIDADES DE MARISQUEIRAS DA BAÍA DE TODOS OS SANTOS, BAHIA, BRASIL.

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