Tome uma Curvina de bom peso e carne dura, esfregue com suco de dois limões, em seguida tempere com alho sal e umas boas pimentas ardidas, passe na farinha de guerra e fite em abundante azeite de dendê, sem muitos contornos esta receita prova que o ato de Cozinhar é um modo de amar os outros, nas sabias palavras do Mia Couto.
Falar em peixe na Bahia, é recordar Dorival Caymmi e a preguiça baiana; ou no melhor estilo Ócio Criativo que ele mais que ninguém soube traduzir sobre a nossa cultura.
Quem não conheceu o peixe Frito de Dna. Cabocla e a cervejinha gelada de Seu Arlindo Boi, valentão pescador de Itapuã, saberá pouco do que estou falando, mas talvez ai reste o grande diferencial gastronômico e sedutor da Bahia, sua gente simples e a atmosfera que compõe a vida do “homem do mar”: seu trabalho, suas relações familiares, suas crenças religiosas, sua fé, seus medos e seus amores.
O litoral brasileiro tem rico receituário a partir de peixes fritos, em Natal a Ginga com Tapioca, é famosa a 60 anos,
uma receita criada pelo casal Januário, onde junto ao peixe se utiliza a tapioca e o Coco, formando uma canoinha e logo depois frito.
Miguel de Carvalho, cordon-bleu dos mais famosos deste país, explicava que não há uma comida típica brasileira, mas uma mistura de heranças africanas e dos índios, influenciando a cozinha brasileira, adaptada através dos tempos:
"O índio influencia mais no norte do que no sul e faz parte do folclore. Nas receitas antigas podemos notar todas as influências, notadamente portuguesa, até nos termos usados como farinha do reino, que é a farinha de trigo, mas como vinha de lá, ficou sendo chamada assim. No norte e nordeste come-se mais peixe que no sul e centro, mas em compensação, os legumes são poucos conhecidos, exceção do quiabo, maxixe e o jerimum. A culinária mais rica é a da Bahia, com vários pratos conhecidíssimos em todo o país. Entretanto, quando este tipo de comida chega a nós, não estamos habituados ao tempero quente – isto é, com muita pimenta – nem ao uso do dendê".
Há vários livros sobre a cozinha baiana todos baseados em Manuel Querino, mas sobre culinária nortista e nordestina é difícil se encontrar, a não ser que busquemos nos cadernos particulares das famílias tradicionais.
Hoje já não existem barracas de praia, ou no minimo um esdruxulo projeto vindo da cabeça de quem detesta a Bahia, ou pensa na Orla de Miami como parâmetro de civilidade.
“A cozinha, pensada no seu sentido mais amplo, é uma linguagem que revela muito sobre uma sociedade e até mesmo sobre um grupo inserido nela. É um espaço imaginário composto por alimentos, ingredientes, modos de preparo e comportamentos”.
Rebekka Fernandes Dantas,nutricionista.
Curibatá, Bagre seco, Curvina, Guaricema, Sororoca, Vermelho e Rabo aberto, Petitinga, Xaréu, Xangó, Beijupirá, infelizmente nenhum destes peixes encontrados no litoral da Bahia, são aproveitados como elementos da nossa cultura, nem chegam a frequentar os cardápios dos restaurantes de fama, quanto mais despertar o interesse dos Chefs locais em criar receitas, preferindo o Salmão o Bacalhau fresco, peixes congelados, que viajam centenas de quilômetros para chegar as baias dos mercados.
O mar inspirou este eterno baiano, Caymmi, com sua voz e seu violão, modernizou a MPB a partir de seus cantos do mar e do samba-canção, influenciando a bossa nova, a tropicália e tudo o que veio depois. (“É doce morrer no mar/ nas ondas
verdes do mar.”); ou na bela marcha-rancho “Canção da Partida” (“Se Deus quiser/ quando eu voltar do mar/ um peixe bom eu vou trazer”). Na conexão baiana, entra ainda o candomblé (“Ele foi se afogar/ fez sua cama de noivo/ no colo de Yemanjá”). Esse culto afro-brasileiro juntou o eclético Dorival, com o comunista Jorge Amado, o pintor argentino Carybé e o cosmopolita diplomata, poeta e letrista Vinicius de Moraes. Caymmi dedicou a Yemanjá canções como “Dois de Fevereiro”, “Sargaço Mar”, “Promessa de Pescador”; e compôs a famosa “Oração de Mãe Menininha”, consagrada na voz de Clementina de Jesus. Tudo isso vem da Bahia, como o próprio Caymmi. Seu bisavô, um engenheiro italiano, veio ao Brasil trabalhar nos reparos do Elevador Lacerda, seu pai funcionário público, tocava piano, violão e bandolim.
A mãe, dona de casa, mestiça de portugueses e africanos, ficava em casa cantando o dia inteiro. Ouvindo discos de 78 rotações na vitrola, o menino sonhava em ser compositor.
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