quarta-feira, 22 de abril de 2015

Pequeno Dicionario da Cozinha Baiana

Verbete Fumeiro
O Recôncavo Baiano mantém a tradição do fumeiro, 
uma técnica secular, herdada dos colonizadores, que coincide com a forma que os índios preparavam o moquém, para o beneficiamento dos seus animais.

A defumação ou fumagem, é um processo herdado dos portugueses que aqui chagaram e se instalaram no Recôncavo Baiano.
Em Maragogipe, município vizinho à barroca Cachoeira a 100 quilômetros de Salvador e uma das artérias do Recôncavo Baiano, Paulo do Porco, e o mais notório e procurado entre os "fumadores" de carne da região.


Como registrou Câmara Cascudo: "O moquém era aparato regular na parafernália doméstica do litoral atlântico, bem posterior ao espeto. De todo o Brasil quinhentista. Todos os cronistas, missionários e conquistadores mastigaram carne moqueada. E gostaram”. Cascudo enfatiza a coincidência técnica: "Esse boucan, ou moquém, coincide com as grelhas europeias e distanciou de menu ameraba as carnes queimadas que o contato direto com o brasileiro determinaria”.


Paulo, começou a moquear carne aos 15, aprendeu com o pai, Antônio Rodrigues da Silva, morto aos 70, há mais de 30 anos. Que, por sua vez, herdou a técnica de gerações sucessivamente anteriores. Os dois filhos de seu Paulo, já adultos, aprenderam a moquear porco com o pai.

O porco de seu Paulo não é excessivamente gordo. "Na roça, a carne fica mais gorda, o povo cria o porco na roça com jaca, com mandioca. Esse porco de ração dá menos gordura, mas dá um filé maior. O caipira não dá um filé ou um coxão igual a esse não", compara. Depois de cortado, o porco recebe sal fino. "Tem gente que moqueia no mesmo dia. Quanto mais dormir, deixar no sal de um dia para o outro, a carne sai mais bonita e escorre a água dela. No outro dia, ela moqueia mais ligeiro, fica mais bonita", diz ele.

Para fazer lingüiças, são usados os tubos intestinais de bois. Secos e novamente demolhados para ganhar flexibilidade. Através de um funil de alumínio, aparas e sobras dos grandes pedaços de carne descem pelos sacos compridos de tecido animal até virarem lingüiças.

A defumação fica no fundo da casa em que ele vive com os filhos, Faulkner e Paulo Leandro, já adultos. É uma pequena construção de três cômodos contíguos, as paredes nuas de tijolo e barro continuamente pintadas pela fumaça da madeira. No cômodo do meio, como também na varanda da construção, estão os moquéns: fornos constituídos de trempes de pau sobre paredes na altura de um metro e meio. Embaixo, o espaço para as madeiras em brasa.

Antes de os portugueses aprimorarem e introduzirem novas técnicas de defumação nesta margem do Atlântico, índios de várias nações étnicas defumavam peixes e caças para lhes alterar textura, agregar sabor e, sobretudo, eliminar bactérias, garantido a conservação. 

Tinha - e tem ainda - para esta trama ou trempe de madeira o nome de moquém. A técnica elimina os excessos aquosos e concentra as características sápidas da carne.

Com o moquém dos índios, houve coincidência técnica em relação ao fumeiro dos primeiros portugueses. Tanto que seu Paulo chama sua carne como de fumeiro ou moqueada.

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