Por Veronique Greenwood
Frutas que parecem mais doces nem sempre contêm mais açúcar, diz pesquisa
Estamos
habituados a pensar no açúcar como o “rei” da sensação de sabor doce.
Se uma laranja é doce, é porque os açúcares contidos nela são percebidos
pelos receptores desse tipo de gosto em nosso paladar.
E a mesma regra
deveria valer para qualquer outra fruta, de morangos a tomates.Mas Linda Bartoshuk, psicóloga e cientista especializada em paladar da Universidade da Flórida, acredita que há uma explicação diferente.
Ela e seus colegas descobriram que os produtos químicos responsáveis por uma grande parte da sensação doce das frutas são, na realidade, inalados e processados pelo olfato – e não sorvidos com a língua.
Trata-se de um fenômeno diferente do que acontece quando brincamos de tampar o nariz enquanto mastigamos uma jujuba – algo que nos impede de identificar seu sabor. (Se você nunca tiver feito essa experiência, vale a pena tentar: é uma maneira incrível de entender como o paladar não está relacionado apenas à boca).
A pesquisa recente de Bartoshuk e sua equipe, no entanto, não aborda as conotações complexas do sabor. Ela trata de compreender o sabor doce em si.
Bartoshuk é uma das maiores autoridades do mundo sobre o sentido do paladar, mais conhecida por sua descoberta na década de 1990, em que uma em cada quatro pessoas é um "supertaster".
Esses indivíduos "viver em um mundo do gosto de néon", diz ela, onde doce é muito mais enjoativo, e o amargo mais adstringente, do que para a maioria de nós. Mas esta conclusão é apenas uma pedra angular do trabalho de 40 anos de dedicado a desvendar o mais enigmático dos sentidos humanos, um corpo de pesquisa honrado em abril pela eleição de Bartoshuk para a Academia Nacional de Ciências.
Revelações de um tomate
Descoberta sobre papel de compostos voláteis no paladar veio em pesquisa com tomates
Somente há alguns anos, enquanto ela e seus colegas trabalhavam em um estudo para tentar identificar exatamente quais moléculas são responsáveis pelo gosto dos tomates, ela encontrou algo surpreendente.
A equipe havia analisado a composição de 152 variedades mistas de tomate, registrando os níveis de glicose, frutose, ácidos e 28 compostos voláteis (substâncias que evaporam em condições normais de temperatura e pressão). Ao mesmo tempo, ao longo de três anos, eles organizaram degustações com voluntários para avaliar 66 destas variedades, classificando cada uma de acordo com sua doçura, sua acidez e outras características de sabor.
Bartoshuk ainda se lembra do momento em que ela estava sentada em seu escritório, com uma montanha de dados, e executou um teste, por curiosidade, para ver quais os compostos que mais contribuem para o gosto adocicado do tomate.
Ela esperava que a resposta seria açúcar, mas "quase caiu da cadeira", segundo conta: também contribuíam significativamente nada menos que sete substâncias voláteis.
Doce mistério
Compreensão do sabor pode levar à elaboração de alimentos com menos açúcar
Por exemplo, a equipe testou uma variedade chamada Yellow Jelly Bean e outra de nome Matina. O tomate Jelly Bean contém 4,5 gramas de glicose e frutose em 100 mililitros de fruta, e ocupou o número 13 em uma escala para a sensação doce. O Matina possui pouco menos de 4 gramas de glicose, mas foi classificado com um gritante 25 no ranking.
A principal diferença bioquímica entre os dois é que o Matina tem pelo menos o dobro de cada um dos sete voláteis do Jelly Bean. Quando a equipe isolou esses voláteis de um tomate e os adicionou a uma mistura de água com açúcar, a percepção do sabor doce deu um salto.
Eles também investigaram blueberries e morangos, entre outras frutas. Morangos têm muito menos açúcar do que blueberries, mas são constantemente avaliados como bem mais doces. A equipe da Universidade da Flórida acredita que isso ocorre porque o morango tem até 30 voláteis a mais que a blueberry.
Eles descobriram que a adição de compostos voláteis do morango à água com açúcar impulsionou a percepção da doçura ainda mais do que os do tomate. A combinação dos voláteis de ambos dobrou essa sensação.
Não que o aroma dos morangos ou dos tomates estivessem pairando acima da água – não havia uma concentração suficiente deles para evaporar e chegar ao nariz. O que os cientistas sugerem é que quanto mais açúcar está presente, menos os voláteis contribuem para a percepção do sabor doce.
Mas os efeitos se tornam mais fortes quando há um número maior de voláteis envolvidos – até os compostos presentes em quantidades mínimas contribuem para o gosto.
Manipulação de alimentos
Os pesquisadores ainda estão investigando como e por que o cérebro processa essas informações. Sabe-se que os sinais vindos dos receptores olfativos ativados pelos componentes voláteis são enviados para a mesma parte do cérebro que regula o paladar, em vez de serem mandados para o local que controla as percepções vindas do nariz.Embora não seja uma neurocientista, Bartoshuk sugere: “Quando no cérebro há voláteis atingindo as mesmas células que atuam no paladar, ele integra a mensagem. E parte dessa integração resulta em um realce da sensação, dependendo dos componentes e dos sabores envolvidos”.
Enquanto os pesquisadores continuam a investigar as causas desse estranho efeito, podemos começar a sonhar com as possibilidades que se abrem diante de nós: seria possível fazer uma limonada com menos açúcar se colocassem nela um coquetel de voláteis? Bartoshuk acredita que sim.
Outra consequência seria a manipulação dos voláteis para a produção de frutas mais doces, uma ideia com a qual a cientista também vem flertando.
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