Oriunda do vocabulário francês, a palavra “gourmet” caracteriza tudo aquilo que representa charme, elegância e sofisticação. Associado principalmente à gastronomia, o
termo é usado como adjetivo para qualificar e diferenciar a alta cozinha, através da elaboração de pratos exclusivos, refinados e, por circunstâncias, até artísticos. Todavia, de um tempo para cá, o assunto tornou-se grande motivo de polêmica entre os chefs ao redor do mundo: a “gourmetização” culinária é uma afronta aos padrões históricos e culturais da arte gastronômica?
Para grande parte dos especialistas da área, atualmente, há uma banalização dessa expressão. O uso corriqueiro do termo descaracteriza o fator singular da palavra – o glamour –, conforme explica a consultora BRF Food Services, Isabel Pisa. “Para quem conhece a alta gastronomia, trata-se de uma desconexão com a realidade gastronômica. Conceituo o termo Gourmet como produtos de alta qualidade, culinária como arte, totalmente personalizada. Acredito que algumas pessoas aproveitaram a onda de grandes chefes, mas reproduzem algo pequeno, sem expressão, e, mesmo assim, classificam de gourmet”, avaliou a chef.
Sempre atenta às questões culinárias, a chef Lara Brittes também se diz incomodada com essa “gourmetização” da gastronomia. Segundo ela, a banalização do termo acontece, acima de tudo, por questões econômicas e mercadológicas. “Eu acho que a banalização é uma forma de chamar atenção de um prato para que possa se cobrar mais caro. Muitas vezes a pessoa nem mesmo sabe o real significado da palavra gourmet e a usa de forma aleatória, desmerecendo o termo para valorizar o seu prato mais barato. A cozinha gourmet tem um preço maior sim. Usar ingredientes exóticos e raros, têm um custo bem alto, inclusive da mão-de-obra que precisa ser mais qualificada”, destacou a profissional, dando o seu próprio conceito de gourmet, tanto para quem o prepara, quanto para os que degustam.
“Gourmet, para mim, é quando a alimentação passa do limite fisiológico. Uma comida gourmet é uma comida mais especial, com toques delicados. Quem faz o prato, dedica-se mais à técnica de preparo e aos ingredientes mais raros. Já uma pessoa gourmet, é uma apreciadora dessa comida feita excelência, que espera uma experiência única e prazerosa, não apenas um prato para matar a fome”, disse.
Acima de rótulos está a técnica
O chef Joaquim Pedro Paes Leme também vê o conceito gourmet usado de forma leviana e contraditória. No entanto, ele acredita, que a banalização não afeta em nada a real essência da alta gastronomia. “É, acima de tudo, uma displicência! Hoje você vê qualquer restaurante banalizando esse conceito sem nenhum critério e exclusividade. No entanto, quem realmente entende e se interessa pela alta cozinha, sempre saberá diferenciar o que está comendo. Gourmet significa o que há de melhor, é a culinária 5 estrelas, e isso é inabalável”, enfatizou.
Exemplos – A coxinha, típico salgado brasileiro feito à base de fritura e recheio de frango, pode ser gourmet? De acordo com Lara Brittes, a tradicional iguaria que você encontra nas padarias não, mas, se reinventadas com técnicas e ingredientes adequados à alta cozinha, podem sim juntar-se ao conceito. “Uma coxinha feita com pato, cogumelos e um molho especial, por exemplo. Neste caso, o emprego da palavra cai bem, porque você reformula uma iguaria simples com toques refinados. O pato é muito mais caro do que frango, por isso não podem ser colocados no mesmo patamar gastronômico. Só que as pessoas não entendem e acham que podem “gourmetizar” a coxinha de frango”, argumentou a chef, resumindo seu argumento em outro exemplo.
“Se você tem um prato com arroz, feijão, batata frita e carne, não pode chamar de gourmet. Isso seria banalizar a palavra. Estaria dentro dos padrões gourmet se fosse uma releitura do prato, incluindo ingredientes mais nobres e técnica apurada, como um risoto de arroz arbóreo com feijão, batata assada com especiarias, filet mignon com molho Rossini”, comentou.
Um dos mais fiéis exemplos, segundo Joaquim Pedro, para enfatizar a banalização do termo são os espaços gourmets, tão usados atualmente em casas e condomínios para encontros sociais. “O espaço em si pode ser considerado gourmet, no entanto, o que fazemos com ele é o que mostra o desconhecimento do conceito gourmet. Vemos as pessoas usarem essa área para festas, lanches, churrascadas... Para isso, o termo correto é salão ou simplesmente cozinha”, finalizou
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