domingo, 2 de agosto de 2015

Atlas da Culinária da Baia de Todos os Santos

O Atlas da Culinária da Baía de Todos-os-Santos, da Edufba, mostra a forma como os moradores de  173 comunidades se relacionam com a comida e as implicações do lugar na definição da pesca como principal ingrediente.

Na mais extensa baía costeira do Brasil vivem 3,5 milhões de pessoas. A região tem 56 ilhas, sendo uma delas Itaparica, a maior do país. Em pelo menos 173 comunidades já não se sabe: é a pesca que justifica a cozinha ou o contrário? De certo, o que existe é o mar, o rio e o mangue, três partes do que temos de "baiana" em nossa comida.
Assim nos situa o Atlas da Culinária na Baía de Todos-os-Santos, publicado pela Edufba. A pesquisa, feita em 14 municípios do entorno da baía, de Salvador a Cachoeira, resultou em 30 pratos, 21 deles detalhados no livro. "Mas este não é um livro de receitas", apressa-se com as definições o químico Jailson de Andrade, um dos quatro organizadores do Atlas.

"É mais um modo de entender o que as pessoas comem e a forma como elas se relacionam por causa da comida", explica. E o lugar, obviamente, com suas características marcantes. Por exemplo, a cozinha da Baía de Todos-os-Santos ainda é feminina. Dos 15 perfilados para este Atlas, há apenas um homem, Joel dos Santos Filho, que vende acarajé e abará na Misericórdia, em Itaparica. O livro traz também uma contextualização histórica. Nessa região estão misturados saberes de índios, portugueses e africanos, transmitidos por uma oralidade, e essa cultura oral se mantém - a equipe quase não encontrou anotações das receitas que coletou. É a comida que "aponta caminhos da tradição amalgamada nas trincheiras de uma mestiçagem forjada em luta, sangue, resistência e festa", escreveu Gal Meirelles, também organizadora do Atlas.

Balé das Gaivotas 
Por Gal Meirelles
A pesca artesanal na Bahia é a principal fonte de renda entre os habitantes de 64 municípios dos 417 que compõem o estado. Em sua maioria, as relações de trabalho são organizadas no seio familiar, havendo pouca ou nenhuma interferência de colônias de pescadores, associações e cooperativas. Os pescadores, marisqueiras e demais
trabalhadores pescam, beneficiam e vendem peixes e mariscos à margem do sistema comercial institucionalizado. Formam, assim, um bloco paralelo que mantem a tradição pesqueiras na capital e no interior. Vale destacar que a Baía de Todos os Santos – enquanto maior baía navegável do litoral brasileiro – comporta grande número de pescadores artesanais e trabalhadores do mar. Além disso, pela importância histórica, cultural e biológica possui oito Unidades de Conservação Integral (UCI); uma sob administração do poder federal, quatro pelo estado e três em nível municipal.
Entre os distritos baianos, destaca-se as atividades exercidas na Ilha de Itaparica, maior área insular do Brasil, cujo território divide-se entre os municípios Vera Cruz e Itaparica. O lume recai especificamente sobre o distrito de Baiacu que desde 1602 – a partir da chegada da missão jesuítica do padre Luiz da Grã à contra-costa da Ilha – espalha-se por entre estuários e enseadas contornados por manguezais. Da conformação de lama, lodo, limo, apicuns e marés, há quatro séculos homens e mulheres comungam a faina diária da captura e beneficiamento de peixes, crustáceos, mariscos, moluscos, fazendo da comunidade uma das mais privilegiadas no que tange a diversificação de artes de pesca. Entretanto, este texto se baseia na pesca de arrasto de massambê e xangó, que cria postos de trabalho gera renda para pescadores e também para carregadores, escamadeiras, atravessadores, proprietários de redes e canoas, donos de restaurantes e similares. Por isso, a atividade pesqueira transforma Baiacu na principal referência de pesca artesanal na Ilha de Itaparica. O texto recorta, por meio da narrativa etnográfica e da poética visual, o papel das gaivotas na captura dos cardumes de xangó e, consequentemente, na manutenção de práticas de etnoconservação marinha e do sistema sócio-identitário da comunidade.

Atualmente Baiacu conta com oito tripulações de arrasto que se revezam na captura das referidas espécies; cada uma é comandada por um mestre proeiro, responsável em agenciar os demais tripulantes, denominados moços que se organizam nas funções de abaixador, largador de cortiça, largador de chumbo, pé de banco e popeiro. As remunerações – além do quinhão de pescaria – correspondem à função exercida na canoa, sendo que ao mestre cabe o maior percentual dos valores arrecadados. Nos casos em que o mestre não é dono dos meios de produção como canoa, rede e demais artefatos, fica também responsável pelo repasse do valor equivalente aos devidos proprietários.

Atlas da Culinária na Baía de Todos os Santos
Autor(a): Jailson de Andrade, Vanessa Hatje, Gal Meirelles e Núbia Ribeiro (Org.)
Ano: 2013
Área: ECONOMIA DOMÉSTICA
ISBN: 978-85-232-1130-1
Valor: R$ 70,00
Nº de Páginas: 182
Dimensões: 19 x 25 cm
Peso: 880g

Idioma: Português

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