segunda-feira, 29 de junho de 2015

Bom Bocado e a opulência do "Ouro Branco" em Portugal e no Brasil.

"Sem a escravidão não se explica o desenvolvimento no Brasil de uma arte de doce, de uma técnica de confeitaria, de uma estética de mesa, de sobremesa e de tabuleiro, tão cheias de complicações e até de sutilezas e exigindo tanto vagar, tanto lazer, tanta demora, tanto trabalho no preparo e no enfeite de doces, dos bolos, dos pratos, das toalhas, das mesas. 

Só o grande lazer das sinhás ricas e o trabalho fácil das negras e das molecas explicam as exigências de certas receitas das antigas famílias das casas-grandes e dos sobrados".
Gilberto Freyre

Portugal vivia no século XVI, a opulência do OURO BRANCO desde o surgimento do "assucre" madeirense,
O comercio do Açúcar foi o produto de maior sucesso comercial do Brasil colonial. O primeiro produto a ser explorado foi o pau-brasil, que deu o nome ao país, mas a qualidade do solo e do clima propiciaram, desde cedo, a cultura da cana. Teve início em 1532, quando o governador-geral, Martim Afonso instalou o primeiro engenho na capitania de São Vicente. Os colonos receberam terras para o cultivo, em regime de sesmarias, ficando obrigados a pagar o dízimo ao capitão donatário. Por sua vez, as terras eram arrendadas aos agricultores mediante um contrato escrito, por um período de 9 a 18 anos.
Entre 1570 e 1670, o Brasil tornou-se no maior produtor de açúcar mundial.

As províncias de Pernambuco, Baía, São Vicente e Rio de Janeiro eram os centros mais importantes. O êxito da cultura da cana teve origem numa série de vários fatores. O cultivo era possível independentemente da topografia do terreno, a cana podia ser cortada a cada seis meses, não eram necessários trabalhos de irrigação, não existiam pragas, e ainda contavam com uma mão de obra escrava abundante para os trabalhos agrícolas. 
A riqueza que rapidamente se gerou atraiu a cobiça dos estrangeiros, primeiro os franceses e depois dos holandeses que aí se instalaram durante várias décadas e, mais tarde, dos corsários ingleses.
A origem da Doçaria Conventual em Portugal terá origem no século XV. 
Terá sido neste período que o açúcar entrou na tradição gastronômica dos conventos. 
O principal adoçante até esta altura era o mel, sendo o açúcar um ingrediente vulgar. Com a colonização da Ilha da Madeira, o açúcar recebe uma atenção especial, sendo
cultivada a cana de açúcar.
A lista de doces conventuais é extensa e abrange todas as regiões de Portugal. Saliente-se, ainda, que a confecção de um determinado doce pode variar consoante a região, e o convento de origem. As receitas das mesas senhoriais foram levadas pelas freiras nobres que confeccionavam doces finos e sofisticados, para as embaixadas da Corte e do Papa. 

Esta doçaria conventual era marcada por uma personalidade muito própria diferenciando assim os inúmeros doces: bolo prior, barriga de freira, frades, beijos de frades, lágrimas, doce de esperança, fatias de bispo, pudim princesa, sopa da rainha, papos de anjo etc. Apesar dos ingredientes da doçaria conventual serem abundantes em frutas cristalizadas, especiarias, amêndoas, vinho, a enorme quantidade de ovos utilizado nas receitas foi a principal característica da época. Os confeiteiros ou mestres do açúcar criavam uma doçaria escultória enquanto os pães de açúcar, as conservas de frutas: cidradas, aboboradas, nesperadas, pessegadas, uvadas, laranjadas, batatadas, marmeladas eram recomendados nas receitas, para chegar até o ponto de espadana porque se destinavam ao embarque. As geléias caseiras também já eram muito apreciadas.

Significado de Bom-bocado
m. Variedade de doce, feito de açúcar, amêndoas pisadas, gemmas de ovos e chila.

Para os Portugueses, um bocado é uma oportunidade de passar bons momentos, de desfrutar de deliciosos momentos, talvez esta seja a raiz do pensamento, ao comermos este docinho.
De sua origem Conventual, resta pouco, nas receitas mais tradicionais ele era feito com calda grossa de açúcar à qual, depois de fria, se misturavam muitas gemas, um pouquinho de farinha, manteiga e amêndoas trituradas, levando-se a assar em forminhas, no processo conhecido por banho-maria.
A generosa utilização de ovos nas cozinhas doces Portuguesas, se dava em grande parte, devido ao fato de que Portugal foi o principal produtor da Europa entre os séculos XVIII e XIX.
As claras, eram usadas para engomar os hábitos das religiosas. Foi para utilizar as gemas que seriam descartadas que se inventaram os doces citados, especialmente depois que a cana de açúcar, levada da Índia para a Ilha de Açores, e enfim trazida ao Brasil para virar açúcar e voltar a Portugal, derramou sua doçura pela Península Ibérica.
A farinha de trigo cedeu lugar ao fubá e à mandioca. 
O queijo foi trocado pelo coco ou com ele vem mantendo boa convivência. As amêndoas desapareceram, até porque durante séculos seu preço tornou-se proibitivo na mesa brasileira.
Vale citar a comparação feita por Gilbrto Freyre, entre Lisboa quinhentista e as capitais brasileiras do seculo XX. 
"Um costume conservado de Lisboa do seculo XlV, foi onde as negras com panelas, balaios e tabuleiros de doces, pelas ruas do Rio, da Bahia, do Recife, apregoando Alfeloas, seu Alfenin, seu doce"
Nosso bom-bocado já rivalizava com o original, produzido nas cozinhas senhoriais. O francês Debret retratou muitas escravas em suas aquarelas datadas de 1826. 

Com suas longas saias rodadas e coloridas, grandes tabuleiros repletos de delícias na cabeça, seriam resgatadas pela análise sociológica de Gilberto Freyre, para quem “do cultivo da cana, do engenho e da senzala.


Assim surgiu o Bom-bocado
Receita Portuguesa datada de 1935:
Ingredientes: 
1 chávena(xícara) de leite de coco puro 
1 colher (sopa) de farinha 
1 colher (sopa) de manteiga, derretida e fria 
2 chávenas de açúcar 
4 ovos 5 gemas 6 colheres (sopa) de queijo curado, ralado fino
Confecção: Misture bem as claras e as gemas, previamente coadas. Acrescente o açúcar, a farinha e o leite de coco, misturando bem após cada adição. Em seguida, passe esta mistura por um coador, para afilar a massa. Junte, então, a manteiga e o queijo, misturando novamente os ingredientes. Deite a massa em forminhas, untadas com manteiga e polvilhadas com açúcar. Disponha as taças num tabuleiro e leve a cozer, em banho-maria, em forno moderado, durante cerca de 25 minutos. Desenforme os bolos enquanto estiverem mornos e ponha-os em forminhas de papel.

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