sábado, 11 de julho de 2015

Convidamos a Chef Rosa para um tête-à-tête, e ela nos presenteia no Bate&Leva de Hoje.

Empoderamento Feminino e as novas formas de gastronomia são um dos bons temas que podem ser traduzidos pelo olhar da Chef Rosa Gonçalves, nossa entrevistada de hoje no Bate&Leva.
"Não passo sem cuscuz e farofa", esta afirmação poderia ser a de muitos de nós, que reconhecem no alimento a importância afetiva, que cada dia se apoia no resgate da nossa auto estima. Mas a fala é da Chef Rosa Gonçalves,
uma das nossa empreendedoras mais ativas. Mulher, nordestina, de fala mansa e coração grande, encontrou no Festivais uma forma contemporânea de dar visibilidades aos pequenos empreendedores de alimentos do interior da Bahia e vem se dedicando com afinco à esta grande missão.

E isso ela faz de forma certeira, faz sua pesquisa direta na fonte: Viajando pelo interior buscando o conhecimento dos nossos ingredientes, receitas, história dos pratos e da nossa gente.  
A troca que estabelece com os agricultores familiares, pescadores e produtores de alimentos que me contam suas histórias, suas lembranças, seus modos de cozinhar, enriquece minha compreensão acerca da riqueza gastronômica da Bahia, em troca ensino-lhes o que sei e venho aprendendo.  
Grandes são os bons resultados, todos saem ganhando e é bacana porque as pessoas vão buscando na memória histórias que estavam adormecidas, e eu saio por aí divulgando os produtos e receitas deles nos festivais que organizo, nos que participo e em palestras e assim vou dando minha contribuição.  Faço isso desde antes dessa onda, desse modismo em torno da “gastronomia de raiz”.Diz a Chef

"O brasileiro quer empreender, vejo isso em todo interior da Bahia: produtores de beijus, carnes defumadas, embutidos, geléias, polpas de frutas, queijos, biscoitos, bolos, pães e o
povo quer consumir também esses produtos artesanais, que conhecem a procedência.  É necessário que esse pequeno produtor receba apoio, incentivo, e isso não é paternalismo, é justiça, o pequeno produtor precisa receber o apoio que é dado às grandes empresas.  Mas o bom mesmo é saber que brasileiro não desiste, ele conhece a sua força, a sua capacidade de trabalho."
Chef  Rosa Goncalves

Bate&Leva

<Se Você pudesse sentar à mesa com a Chef Rosa Gonçalves, O que lhe perguntaria?

R - Por que você ama tanto a comida do povo da Bahia?


<Você acha que o mercado cresceu e as pessoas estão mais conscientes em termos do que é uma "boa alimentação"?


R - Sim, o mercado vem crescendo cada vez mais. Uma boa parcela da população passou a ter mais consciência, buscando ter uma melhor alimentação, querendo saber a procedência do que consome. Lógico que isso não é uma regra geral.  Mas só em já termos uma parcela da população interessada em melhorar a sua alimentação já é um grande avanço, isso vai fazendo que as mudanças positivas aconteçam.


<Como Você vê a notícia de que 70% dos alimentos in natura consumidos no país estão contaminados por agrotóxicos?


R - Vejo com grande tristeza. O número de pessoas com problemas na saúde é o resultado do consumo desses produtos.  Doenças que antes eram raras, hoje estão acometendo um grande número de pessoas.  Sonho em ver essa situação se reverter, que nossos alimentos voltem a ser limpos e saudáveis. A nossa esperança é que venham formas de incentivos para a agricultura orgânica que barateiem a produção, tornando esse produto mais acessíveis a todas as camadas da população.


<Sei que você circula pelo interior da Bahia, conversando com políticos, técnicos em agronomia, gente ligada a agricultura familiar e orgânica, tem sentido algum interesse de melhoria desta questão acima no campo?


R - Sim. Encontro pessoas de várias áreas preocupadas com o que vem acontecendo com a nossa agricultura. Em várias regiões da Bahia encontro pessoas fazendo trabalho de formiguinha, martelando no mesmo assunto, insistindo e já colhendo resultados. Considero algumas dessas pessoas heróis e heroínas anônimos do nosso povo. 



<O brasileiro é muito criativo e gosta de empreender, o que acha que falta para melhorarmos os índices de vitalidade da pequena empresa?

R - Incentivo. Apoio. Desburocratização. É desestimulante para o pequeno empreendedor ser tratado como se tivesse a estrutura de uma grande empresa. O brasileiro quer empreender, vejo isso em todo interior da Bahia: produtores de beijus, carnes defumadas, embutidos, geléias, polpas de frutas, queijos, biscoitos, bolos, pães e o povo quer consumir também esses produtos artesanais, que conhecem a procedência.  É necessário que esse pequeno produtor receba apoio, incentivo, e isso não é paternalismo, é justiça, o pequeno produtor precisa receber o apoio que é dado às grandes empresas.  Mas o bom mesmo é saber que brasileiro não desiste, ele conhece a sua força, a sua capacidade de trabalho.


<Como fazer para conscientizar da importância dos orgânicos, as populações mais desprotegidas pela sociedade?


R - É falar, falar e falar. Mostrar como é importante para a saúde da família consumir alimentos saudáveis, fazer uma verdadeira limpeza na mesa de casa.  E em muitas cidades o orgânico está ali pertinho. Vivenciamos uma experiência dessas em Barra Grande, no município de Maraú, onde os restaurantes, pousadas e hotéis eram abastecidos de frutas, legumes e hortaliças por empresas  de Salvador, que ficam a mais de 300 km do Município. Durante o 13º Festival da Tainha, em 2014, lançamos a meta de produzir um jantar para 1.000 pessoas só utilizando produtos da agricultura familiar local, ninguém da localidade acreditou que isso fosse possível. O resultado foi que além de produzirmos o jantar, instalamos a feira semanal da agricultura familiar em Barra Grande, tudo orgânico e com preço bem acessível. Às vezes o que falta é quem traga a mostra esses produtos, ou como diria nosso amigo chef Alício Charot: “falta quem faça a provocação”.  Temos que mostrar de uma forma bem prática as vantagens de plantar e consumir orgânico: é a garantia da saúde das nossas famílias.


<Como incentivar os pequenos produtores de produtos agrícolas? Nós  fale sobre uma iniciativa revolucionaria, que você viu no Festival de Luiz Eduardo Magalhães (L.E.M.).

R - O que temos feito com os festivais que temos organizado no interior da Bahia, é principalmente incentivar, valorizar e divulgar o trabalho dos pequenos produtores de alimentos, dos pescadores, piscicultores e da agricultura familiar.  A cada festival que surge depois de um bom trabalho de pesquisas e vivências em cada Região, fazemos novas descobertas, como disse antes, descobrimos heróis e heroínas que desenvolvem seus trabalhos diários sem se dar conta que estão sendo protagonistas de uma ação revolucionária.   O que vivenciamos em Luís Eduardo Magalhães tem sido um grande desafio para nós, muitas pessoas nos questionavam, achando que era uma contradição nós que trabalhamos com gastronomia de raiz, com agricultura familiar, pequenos produtores estarmos desenvolvendo um trabalho em uma cidade que é um polo do agronegócio. No I Festival, em 2014, trouxemos a público o que queríamos dar conhecimento às pessoas: o trabalho dos pequenos produtores de LEM, famílias inteiras vivendo da agricultura familiar, da piscicultura, do fabrico de alimentos artesanais, e o resultado está sendo muito bom, a produção e as vendas aumentando, com um crescimento da autoestima dos que participam do festival. Em LEM acompanhamos uma coisa bem diferente de outros Municípios, pois o poder público municipal está preocupado em incentivar e apoiar os seus pequenos produtores. Os órgãos públicos orientando e se fazendo presente na vida desses empreendedores, buscando e apoiando as soluções. Mostramos aos visitantes a importância desse trabalho que resulta hoje na existência do SIM (Selo de Inspeção Municipal), que já foi dado a 18 empresas do município, todas atuando dentro das normas da vigilância sanitária. Visitamos diversas dessas empresas, produtoras de queijos, embutidos, defumados, pães, etc. e vimos um cuidado com a qualidade da produção e o uso correto de normas e orientações técnicas. Outra vertente importante é a piscicultura, o incentivo à que famílias de agricultores tenham uma outra forma de subsistência. Todo esse trabalho foi apresentado ao público presente no Festival de 2014 e tivemos oportunidade de levar chefes de cozinha, professores e estudantes de gastronomia para visitarem as instalações desses produtores e conhecer seus processos de trabalho. Agora uma das nossas metas no II Festival LEM Gastronomia é utilizar, nas aulas e oficinas que serão dadas por chefes e cozinheiros, 80% de produtos local.

< Você acha que ainda somos, gastronomicamente falando, colonizados, ou melhor já estamos seguros que a nossa culinária é fruto das nossa história, ou tudo isso é somente uma tendência?


R - Tenho observado e buscado entender esse momento. Mesmo que seja uma tendência, precisamos e podemos tirar proveito dela. Vejo chefes realmente sinceros nesse propósito de valorizar a nossa culinária, os nossos ingredientes, isso é o que importa, quem tem propósito sincero, esses

continuarão a pesquisar, a utilizar e divulgar o que é nosso.  Isso é muito importante, creio que ainda temos muito que aprender com outros povos, que fazem da sua culinária uma forte bandeira e a defendem com força, entendendo que esse é um patrimônio vivo e que representa um futuro de progresso. Façamos dessa uma bandeira também no nosso País, pois conhecendo a história da nossa culinária é que teremos segurança em defendê-la e levá-la para as nossas cozinhas. 

<As preferência alimentares são uma das principais bases das identidades culturais, como vê este momento, onde muitos do nossos famosos Chefes voltam-se para valorizar e prestigiar pratos e produtos locais?


R - Vejo como um momento importante. Ver muitos pratos e produtos que sempre foram a base da nossa identidade cultural, hoje sendo utilizado por Chefes badalados, é um reconhecimento que temos sim identidade, temos história. É uma vitória.  Quando poucos tinham coragem de utilizar nossos produtos e incluir nos seus cardápios pratos da nossa cultura, pensou-se até que a nossa história alimentar ia cair no esquecimento, que essa utilização era apenas “teimosia de alguns resistentes” e o que vemos hoje são os nossos produtos e nossos pratos com destaque na imprensa, nos discursos e nas mesas dos chefes mais famosos do país. 


<Como vê a participação das mulheres na gastronomia hoje, ou segue sendo um território o masculino?


R -  As mulheres estão ganhando espaço cada vez maior na gastronomia. Cada uma dessas profissionais buscando uma forma de encontrar, de construir seu espaço. As faculdades de gastronomia estão cheias de mulheres se profissionalizando. Os homens ainda são a maioria nas cozinhas, mas as mulheres estão ocupando seu território no mundo da gastronomia. Mas o mais importante mesmo é que independente do chef ser homem ou mulher sejamos bons profissionais, trabalhando com amor e

sinceridade.

<O Que  te faz brilhar os olhos com seu trabalho?


R - Conhecer gente que faz do alimento a sua vida: plantando, colhendo, produzindo, cozinhando. Pessoas conscientes que alimento é saúde, é vida, é bem-estar

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