domingo, 21 de junho de 2015

Por que sentimos o sabor doce?


Por Veronique Greenwood 
Frutas que parecem mais doces nem sempre contêm mais açúcar, diz pesquisa

Estamos habituados a pensar no açúcar como o “rei” da sensação de sabor doce. Se uma laranja é doce, é porque os açúcares contidos nela são percebidos pelos receptores desse tipo de gosto em nosso paladar.
E a mesma regra deveria valer para qualquer outra fruta, de morangos a tomates.
Mas Linda Bartoshuk, psicóloga e cientista especializada em paladar da Universidade da Flórida, acredita que há uma explicação diferente. 
Ela e seus colegas descobriram que os produtos químicos responsáveis por uma grande parte da sensação doce das frutas são, na realidade, inalados e processados pelo olfato – e não sorvidos com a língua.
Trata-se de um fenômeno diferente do que acontece quando brincamos de tampar o nariz enquanto mastigamos uma jujuba – algo que nos impede de identificar seu sabor. (Se você nunca tiver feito essa experiência, vale a pena tentar: é uma maneira incrível de entender como o paladar não está relacionado apenas à boca).
 A pesquisa recente de Bartoshuk e sua equipe, no entanto, não aborda as conotações complexas do sabor. Ela trata de compreender o sabor doce em si.



Bartoshuk é uma das maiores autoridades do mundo sobre o sentido do paladar, mais conhecida por sua descoberta na década de 1990, em que uma em cada quatro pessoas é um "supertaster". 
Esses indivíduos "viver em um mundo do gosto de néon", diz ela, onde doce é muito mais enjoativo, e o amargo mais adstringente, do que para a maioria de nós. Mas esta conclusão é apenas uma pedra angular do trabalho de 40 anos de dedicado a desvendar o mais enigmático dos sentidos humanos, um corpo de pesquisa honrado em abril pela eleição de Bartoshuk para a Academia Nacional de Ciências.

Revelações de um tomate

Descoberta sobre papel de compostos voláteis no paladar veio em pesquisa com tomates 


Segundo a cientista, a ideia de que compostos voláteis emanados das frutas poderiam estar ligados ao sabor doce já vem sendo discutida desde os anos 1970. Mas os efeitos individuais de cada composto volátil são pequenos, assim como as quantidades de cada produto químico nas frutas.
Somente há alguns anos, enquanto ela e seus colegas trabalhavam em um estudo para tentar identificar exatamente quais moléculas são responsáveis pelo gosto dos tomates, ela encontrou algo surpreendente.
A equipe havia analisado a composição de 152 variedades mistas de tomate, registrando os níveis de glicose, frutose, ácidos e 28 compostos voláteis (substâncias que evaporam em condições normais de temperatura e pressão). Ao mesmo tempo, ao longo de três anos, eles organizaram degustações com voluntários para avaliar 66 destas variedades, classificando cada uma de acordo com sua doçura, sua acidez e outras características de sabor.
Bartoshuk ainda se lembra do momento em que ela estava sentada em seu escritório, com uma montanha de dados, e executou um teste, por curiosidade, para ver quais os compostos que mais contribuem para o gosto adocicado do tomate.
Ela esperava que a resposta seria açúcar, mas "quase caiu da cadeira", segundo conta: também contribuíam significativamente nada menos que sete substâncias voláteis.

Doce mistério 

Compreensão do sabor pode levar à elaboração de alimentos com menos açúcar 



A cientista entendeu ainda que os voláteis pareciam explicar por que os indivíduos que participaram das degustações classificaram algumas variedades de tomate como sendo mais doces do que outras que continham mais açúcar.
Por exemplo, a equipe testou uma variedade chamada Yellow Jelly Bean e outra de nome Matina. O tomate Jelly Bean contém 4,5 gramas de glicose e frutose em 100 mililitros de fruta, e ocupou o número 13 em uma escala para a sensação doce. O Matina possui pouco menos de 4 gramas de glicose, mas foi classificado com um gritante 25 no ranking.
A principal diferença bioquímica entre os dois é que o Matina tem pelo menos o dobro de cada um dos sete voláteis do Jelly Bean. Quando a equipe isolou esses voláteis de um tomate e os adicionou a uma mistura de água com açúcar, a percepção do sabor doce deu um salto.
Eles também investigaram blueberries e morangos, entre outras frutas. Morangos têm muito menos açúcar do que blueberries, mas são constantemente avaliados como bem mais doces. A equipe da Universidade da Flórida acredita que isso ocorre porque o morango tem até 30 voláteis a mais que a blueberry.
Eles descobriram que a adição de compostos voláteis do morango à água com açúcar impulsionou a percepção da doçura ainda mais do que os do tomate. A combinação dos voláteis de ambos dobrou essa sensação.
Não que o aroma dos morangos ou dos tomates estivessem pairando acima da água – não havia uma concentração suficiente deles para evaporar e chegar ao nariz. O que os cientistas sugerem é que quanto mais açúcar está presente, menos os voláteis contribuem para a percepção do sabor doce.
Mas os efeitos se tornam mais fortes quando há um número maior de voláteis envolvidos – até os compostos presentes em quantidades mínimas contribuem para o gosto.

Manipulação de alimentos

Os pesquisadores ainda estão investigando como e por que o cérebro processa essas informações. Sabe-se que os sinais vindos dos receptores olfativos ativados pelos componentes voláteis são enviados para a mesma parte do cérebro que regula o paladar, em vez de serem mandados para o local que controla as percepções vindas do nariz.
Embora não seja uma neurocientista, Bartoshuk sugere: “Quando no cérebro há voláteis atingindo as mesmas células que atuam no paladar, ele integra a mensagem. E parte dessa integração resulta em um realce da sensação, dependendo dos componentes e dos sabores envolvidos”.
Enquanto os pesquisadores continuam a investigar as causas desse estranho efeito, podemos começar a sonhar com as possibilidades que se abrem diante de nós: seria possível fazer uma limonada com menos açúcar se colocassem nela um coquetel de voláteis? Bartoshuk acredita que sim.
Outra consequência seria a manipulação dos voláteis para a produção de frutas mais doces, uma ideia com a qual a cientista também vem flertando.

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